Estudantes brasileiros limpando a sala de aula como no Japão. A escola ocupada como projeto pedagógico.

Quando me contaram que no Japão, desde o jardim da infância, os próprios alunos são os responsáveis pela limpeza e manutenção da sala de aula onde estudam, fiquei perplexo e admirado.

Pelo jeito não sou só eu, no YouTube tem vários videos de professores e alunos estrangeiros que fizeram intercâmbio em colégios no Japão mostrando a faxina diária, preparação da merenda e até a limpeza dos banheiros e privadas nas escolas.


YouTube: katherinem22: A day in my Shoes- Japan (6m31s)

Sempre imaginei que no Brasil esse tipo de atitude seria impensável e que nunca na minha vida veria uma cena dessas acontecer por aqui.

Aquela velha história, dizem que lá fora eles enxergam o patrimônio público como sendo de todos mas no Brasil a gente considera que o que é público não é de ninguém.

Tem também a chamada herança escravocrata que supostamente incutiu na gente o preconceito contra quem faz tarefas braçais e o deslumbramento com quem nunca precisou pegar em uma vassoura ou se ajoelhar pra passar um pano no chão.

Felizmente eu estava errado.

Imagens, videos e relatos nas redes sociais das ocupações das escolas pelos estudantes secundaristas, que vem acontecendo nos últimos anos em vários estados, como forma de protesto, mostram os alunos administrando os bens materiais e espaços de aprendizagem e convivência de forma autônoma e coletiva, incluindo a limpeza, manutenção, alimentação, controle de acesso e segurança.


YouTube: Exponencial: Escola Ocupada; Escola Mendes de Moraes; Escola Ilha do Governador - RJ (Parte 1/2) (1m42s)

Junto com os pais, amigos e professores simpatizantes, voluntários e apoiadores da comunidade e da vizinhança, organizam uma grade de aulas abertas, palestras, oficinas e eventos.

Uma programação que pode ter entre os participantes acadêmicos, profissionais, representantes da diversidade, das minorias, além de artistas, grafiteiros, músicos, esportistas e personallidades, muitos deles de reconhecida reputação. Inclusive programadores de software livre, youtubbers, desenvolvedores de apps e evangelistas do blockchain, espero.

Nestas ocupações a molecada coloca na prática o que aprenderam estudando as ciências do homem e da natureza, mas sobretudo o que fuçaram da internet sobre as experiências de mobilizações anteriores.

Da revolução dos pinguins no Chile, do Movimento Passe Livre, até o Occupy Wall Street, passando pela Campus Party, Burning Man, Animecon, Woodstock, Colônia Cecília e pela ocupação da escola no bairro vizinho, claro.

Diante destes estudantes com seus celulares nas mãos e roteador com chip 4g na mochila, visualizo eles decidindo as coisas em assembléias e grupos no Whatsapp, dividindo tarefas no Google Drive, arrecadando recursos no Catarse, compartilhando follow ups e prestação de contas no Snap e no Instagram.

E o mais importante, elegendo comissões e definindo o rodízio de porta-vozes autorizados a falar pelo grupo com a imprensa, na fanpage no Facebook ou na transmissão ao vivo no YouTube.

Só assim conseguiram até agora escapar da armadilha da eleição de líderes ou entronização de heróis, que a mídia exige pra impor sua narrativa simplificada e limitada da realidade, um sistema configurado pra girar em torno de estrelas e celebridades.

Zonas Autônomas Temporárias

Qual escola vcs acham que prepara melhor o cidadão pra sobreviver em um mundo conflagrado pela uberização do mercado de trabalho, pela airbnbzação da propriedade, pela memetização da democracia representativa e pela bitcoinzação da riqueza?

Uma escola ocupada autogerida por seus alunos e conectada com seu entorno e com o mundo. Ou aquela escola com grades, guaritas e sirenes, com divisão de tarefas, regras e avaliações padronizadas, espremendo o jovem em uma linha de produção como se fosse mercadoria e que vista de fora não se vê diferença com uma fábrica ou prisão.

A resposta parece óbvia e aqueles para quem supostamente toda a estrutura de ensino foi criada. Com ação direta, autonomia e autogestão os adolescentes estão esfregando na cara da sociedade qual o melhor caminho da reforma educacional.

Acredito que muitos educadores devem estar tão surpresos positivamente como eu, já pensando em estratégias para incluir as lições e vivências das ocupações no processo pedagógico.

-------- Instagram: @pukapukaofune | @renatacabrera_

Pra mim esse é um daqueles momentos transformadores, nada será como antes. É ver a História passar diante de nossos olhos como uma manada de bisões atropelando tudo, tremendo o chão e levantando muita poeira. A gente se segura na poltrona, muita gente disfarça dizendo que bisão não existe mais, é bicho extinto e que esse pó marrom é só neblina. Prefiro enxergar que isso já é o novo normal. Escola ocupada, em breve uma perto de você (é bom já estar preparado para ajudar).

Amanha cedo, enquanto um colegial japonês descansa, em algum lugar do Brasil, em uma escola ocupada, vai ser hora de encher o balde de água (recolhida da chuva), lavar o pátio, passar o rodo, fazer pose, escolher o filtro e mandar aquela selfie.


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